Cúpula dos Líderes em Belém teve obstáculos mas registrou avanços

9 de novembro de 2025

Ciro Dias Reis, Palestrante; fundador e CEO de Imagem Corporativa e Walk4Good

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É possível dizer que o pêndulo oscilou bastante na Cúpula dos Líderes sobre o Clima, realizada na quinta-feira e na sexta-feira, dias 6 e 7 de novembro em Belém e que antecedeu a COP30.

Sinalizações positivas e doses de frustração se revezaram na Blue Zone, coração da grande área construída para abrigar autoridades e negociadores de ambos os eventos, para o quais foram mobilizados 10 mil agentes das forças de segurança e 7.500 militares na cidade, além de 1.240 voluntários.

Os números relativos aos investimentos destinados a Belém para que ela pudesse hospedar a COP30 também são altos, chegando a quase R$ 5 bilhões. A maior parte dos recursos foi bancada pelo governo federal para financiar não apenas a construção e adaptação das instalações destinadas aos encontros de trabalho das 160 delegações confirmadas, mas também diversas obras de infraestrutura na cidade.

Essas obras foram de parques a iniciativas de saneamento básico, passando pela reformulação de um terminal portuário onde atracaram navios de luxo destinados a hospedar delegações estrangeiras.

Abaixo estão tópicos de destaque relativos a Cúpula dos Líderes.

Sinais trocados e delicado equilíbrioQuando se refere às mudanças climáticas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem adotado tonalidades variadas, dependendo do contexto: a abordagem é mais enfática quando o foco limita-se ao tema estritamente ambiental e mais flexível quando se discutem os recursos necessários para a transição energética.

Ele é um inequívoco defensor do enfrentamento das mudanças climáticas e dos compromissos efetivos de governos e organismos multilaterais destinados a promovê-lo. Sua gestão pode acenar com um efetivo avanço no combate ao desmatamento na Amazonia, que diminuiu 11% entre agosto de 2024 a julho de 2025 em relação a igual período 2023/2024 segundo estimativa do sistema Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O desmatamento  caiu cerca de 50% se considerados os cerca de três anos de seu mandato.

No que diz respeito às emissões brutas de gases de efeito estufa, dados do Observatório do Clima (ONG que reúne diversos grupos e movimentos da sociedade civil) apontam diminuição de 16,7% ao longo de 2024, a maior queda desde 2009.

Ao mesmo tempo, naquilo que é considerada uma clara contradição por seus críticos, o presidente Lula defendeu durante meses (com apoio de governadores e políticos da região Norte) a aprovação pelo Ibama da realização de testes pela Petrobras na Bacia da Foz do Amazonas. Esta área marítima situada a 175 quilômetros da costa do Amapá é vista como possível abrigo de grandes reservas de petróleo. O objetivo, naturalmente, depois de confirmado esse potencial, seria perfurar e explorar novos poços em alto mar. Do ponto de vista técnico existe otimismo em relação a possíveis descobertas, já que a área está situada numa ampla região denominada Margem Equatorial, onde os vizinhos Guiana e Suriname identificaram há alguns anos grandes reservas e já as exploram comercialmente.

Nesse contexto, o próprio presidente Lula admitiu em Belém, indiretamente, a existência de uma certa ambiguidade no ambiente do governo: “Estou convencido de que, apesar das nossas dificuldades e contradições, precisamos de roteiros para – de forma justa e planejada – reverter o desmatamento, superar a dependência de combustíveis fósseis e mobilizar os recursos necessários para esses objetivos.”

A mensagem, nas entrelinhas, é de que os recursos oriundos de uma nova área de exploração de petróleo na região Norte seriam decisivos para financiar, nos próximos anos, um movimento mais amplo do país rumo a uma economia de baixo carbono.

Viés de alta – Em Belém o presidente conclamou os líderes a atuarem imediatamente para salvar o planeta. “A janela de oportunidade que temos para agir está se fechando rapidamente”, enfatizou em seu discurso de abertura da Cúpula. Apesar das posições de Donald Trump, que comanda a maior economia do mundo e define as mudanças climáticas como uma “farsa”, há sinais de que passos concretos continuarão sendo dados, incentivados por alguns resultados concretos já colhidos.

O crescimento das emissões de carbono, por exemplo, tem sido freado desde o Acordo de Paris. E é notória a expansão do uso da energia solar, da energia eólica e dos carros elétricos, hoje já responsáveis por 20% das vendas globais.

As fontes renováveis ​​ultrapassaram a participação do carvão (considerada a alternativa mais poluente e fartamente utilizado na China e Índia) na matriz energética global no início deste ano. As previsões de um aquecimento de quase 4°C até o final do século foram agora revisadas para cerca de 2,8°C ou menos. Em outras palavras, o caminho ainda é longo, mas continua sendo percorrido.

Desvinculação e NDCs – Realizada todos os anos simultaneamente a Conferência das Partes (COP), pela primeira vez a Cúpula dos Líderes sobre o Clima ocorreu alguns dias antes em Belém.

A CEO da COP30 Ana Toni entende que a desvinculação dos dois encontros foi benéfica por permitir que chefes de Estado e de governo participassem de reuniões fechadas na Cúpula dos Líderes para debater temas específicos e, assim, pudessem melhor orientar seus negociadores antes do início oficial da COP30.

Ela se diz animada com o fato de 106 países estarem levando suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, na sigla em ingês) ao encontro de Belém, no que seria um salto considerável em relação aos 64 que já haviam disponibilizado seus dados até duas semanas antes. O instituto Climate Watch, por sua vez, registrava na sexta-feira dia 7 de novembro como oficialmente apresentadas as NDCs de 79 países, responsáveis por 64% das emissões de gases do efeito estufa.

Para Ana Toni, boa parte das NDCs apresenta uma evolução qualitativa que se traduz em planos mais detalhados para que as metas sejam alcançadas, além de orçamentos condizentes com aqueles compromissos.

As NDC são as atualizações voluntárias das metas que cada país estabelece como contribuição ao esforço coletivo de frear o aquecimento global, em linha com o Acordo de Paris. Este, assinado na COP20, estabeleceu o objetivo de evitar que a temperatura do planeta alcance 2 graus acima dos níveis da era pré-industrial, incentivando esforços para que esse aquecimento não ultrapasse 1,5 grau.

Ausências emblemáticas – Maior emissora de gases do efeito estufa, a China não cogitou ser representada por seu presidente Xi Jinping na Cúpula dos Líderes e enviou Ding Xuexiang, vice-primeiro ministro. A Índia, terceira no mesmo ranking e vista como país de posições ambíguas em relação ao clima, também preferiu não mobilizar sua liderança maior, o primeiro-ministro Narendra Modi, e despachou para Belém seu ministro do Meio Ambiente, Bhupender Yadav.

Estados Unidos, segundo maior emissor de CO2, simplesmente virou as costas para o encontro que, em anos anteriores, teve participação ativa dos ex-presidentes Joe Biden e Barak Obama.

Presenças relevantes – Apesar de ter reunido um número relativamente baixo de 57 chefes de estado ou de governo (menor quórum desde o encontro de 2019), a Cúpula dos Líderes teve aspectos relevantes.

O mais emblemático deles ficou por conta do time europeu: foram a Belém a presidente da Comissão Europeia, Ursula van der Leyen e nomes representativos das cinco maiores economias do continente. Lá estiveram o primeiro-ministro britânico Keir Starmer; o presidente francês Emmanuel Macron; o chanceler alemão Friedrich Merz; o primeiro-ministro espanhol Pedro Sanchez; Antonio Taji, vice-primeiro ministro e ministro das relações exteriores da Itália.

Também presente, o secretário geral da ONU Antonio Guterres manteve o tom duro tradicionalmente adotado em seus alertas sobre os riscos climáticos. “Falhamos”, disse ele referindo-se ao objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5 °C em relação à era pré-industrial. “Mas nunca estivemos melhor equipados para reagir”, ressalvou referindo-se às energias renováveis e aos diversos instrumentos que podem ser usados para reverter o quadro atual.

TFFF – Especialmente importantes nos dois dias da Cúpula dos Líderes foram os primeiros passos concretos para a constituição do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), ideia apresentada pelo Brasil na COP28 em Dubai. O governo de Luiz Inácio Lula da Silva, por sinal, foi o primeiro a se comprometer com um aporte de US$ 1 bilhão para o fundo, número idêntico ao prometido pela Indonésia.

Mas foi a Noruega que surpreendeu ao disponibilizar US$ 3 bilhões, destacando que a preservação das florestas é um tema de interesse do mundo todo e merece esforços especiais para ser alcançado.

Também no primeiro dia do encontro a França ofereceu 500 milhões de euros e tanto Portugal como Holanda também confirmam participação mas com valores quase simbólicos. Esperava-se para a sexta-feira um anúncio de aporte também por parte da Alemanha. Esta, porém, frustrou ao manifestar adesão ao conceito, acenar com a promessa de uma contribuição relevante mas não apresentar números específicos.

Havia também a expectativa de que o Reino Unido pudesse não apenas demonstrar apoio mas revelar valores. O primeiro-ministro britânico, Sir Keir Starmer reconheceu o declínio de um apoio político generalizado à questão das mudanças climáticas. Ele afirmou que o tema chegou a ser motivo de união internacional mas que “infelizmente, esse consenso se perdeu”. Apesar de Starmer reconhecer que o apoio político global ao movimento climático está diminuindo, ele disse aos presentes: “Minha mensagem é que o Reino Unido está totalmente comprometido”.

Na verdade, o governo brasileiro esperava maior número de captações. Em coletiva de imprensa para mais de 120 jornalistas, cinegrafistas e fotógrafos do Brasil e do exterior (que contou com a presença da ministra Marina Silva e de Andreas Bjelland Erikseno, ministro do clima e do meio ambiente da Noruega), o ministro da Fazenda Fernando Haddad parecia desconfortável ao ser perguntado sobre os resultados obtidos até o final da quinta-feira. Ele argumentou que os países em geral só a partir de agora terão condições de analisar todos os detalhes do fundo, inclusive a participação do Banco Mundial na gestão do processo, para então tomar decisões. E finalizou se dizendo otimista em relação a multiplicação das contribuições.

Carbono, fome e pobreza – A busca de uma padronização das regras do mercado de carbono em nível internacional, esforço liderado pelo Brasil, teve um avanço no âmbito da Cúpula de Líderes. O compromisso com a Coalizão Aberta de Mercados Regulados de Carbono ganhou em Belém 11 assinaturas, entre elas as de China e União Europeia. Também são signatários da iniciativa, além do Brasil: Alemanha; Armênia; Canadá; Chile; França; México; Reino Unido; Zâmbia.

O esforço é uma das pautas econômicas da presidência brasileira da COP30. O estabelecimento de regras e padrões capazes de garantir transparência e confiabilidade é visto como fator essencial para o funcionamento de um efetivo mercado de carbono em nível global.

Além disso, o governo brasileiro conseguiu incluir na agenda da Cúpula dos Líderes a “Declaração de Belém sobre Fome, Pobreza e Ação Climática Centrada nas Pessoas”, assinada por 43 países e pela União Europeia. O documento coloca a agenda do combate à fome e à pobreza no centro das discussões climáticas globais e inclui a noção brasileira de que o impacto negativo das mudanças climáticas é desigual, atingindo especialmente os países e populações de menores recursos e maior vulnerabilidade.

Ciro Dias Reis, presidente e fundador da Imagem Corporativa, esteve em Belém para acompanhar a Cúpula dos Líderes.

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