Europa tem desafios para ampliar sua defesa

Ciro Dias Reis, CEO e fundador da Imagem Corporativa 23 de julho de 2025
Imagem: Shutterstock

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Os países membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) estabeleceram a meta de gastar 5% do Produto Interno Bruto (PIB) por ano na área de defesa até 2035 como forma de se preparar para os riscos representados por uma Rússia que mantém intactos o apetite militar e os olhares atentos sobre a Europa.Muitos observadores destacam os obstáculos políticos de se integrar efetivamente os países membros da aliança do ocidente num esforço de defesa comum e ressaltam os desafios econômico-financeiros da empreitada.

Do ponto de vista político, as últimas eleições nacionais na Europa têm espelhado uma polarização crescente que expõe a camada de fragilidade nas relações de poder do continente, a qual permite prever turbulências adicionais nos próximos anos.

Em 2025 candidatos favoráveis aos princípios de uma Europa unida venceram as eleições para liderar seus países na Alemanha (Friedrich Merz) e na Romênia (Nicușor Daniel). Já na Polônia o vencedor na disputa presidencial foi o nacionalista Karol Nawrock, político próximo de Donald Trump e cuja ascensão deve fragilizar o poder de outro Donald, o primeiro-ministro de sobrenome Tusk, este também defensor de uma Europa unida e comprometida com metas e gastos comuns na área de defesa.

A Áustria acaba de passar por uma situação atípica. Depois de meses de negociações foi necessário que três partidos se entendessem para conseguir formar um governo de coalizão em março deste ano, embora nenhum deles tivesse saído vencedor nas eleições de setembro de 2024. Naquele mês as urnas haviam favorecido o Partido da Liberdade (FPO) com 29% dos votos. De extrema-direita e favorável à Rússia, a agremiação não teve apoio suficiente de outros partidos para conseguir formar um governo e acabou ficando fora do poder, abrindo assim espaço para uma maioria de centro. A Áustria, ao contrário de Alemanha, Romênia e Polônia, não é membro da OTAN.

Ainda em 2025, no mês de outubro, eleições na República Tcheca podem premiar novamente forças políticas mais conservadoras. Até agora o líder das pesquisas é Andrej Babis, um bilionário que lidera a oposição e cujo partido caminha em direção à extrema direita, por exemplo via aproximação do grupo da francesa Marine Le Pen (esta uma crítica tanto da União Europeia como da OTAN e que já fez vários acenos ao presidente russo Vladimir Putin ao longo da carreira).

Em 2024 a Eslováquia elegeu para presidente Peter Pellegrini, apoiado pelo primeiro-ministro populista Robert Fico. Consolidou-se assim o domínio da política pelos setores pró-Rússia no país, que a exemplo da República Tcheca também é membro da OTAN.

Se do ponto de vista político existem complexidades para fazer avançar uma frente ampla militar da União Europeia, a questão econômica também se coloca como outro quebra-cabeças a ser equacionado.

Países do bloco com tradicionais compromissos com o chamado bem-estar social (programas de seguro-desemprego generosos; sistemas de saúde abrangentes) veem-se na iminência de redirecionar para fins de defesa parte de investimentos naquele campo. Essa transição pode gerar desconforto em parte da classe política e do eleitorado.

Mas alguns cálculos permitem reequilibrar essa discussão.

Durante a pandemia do Covid19 a União Europeia gastou em torno de 2,8 trilhões de euros (mais de 30% acima do PIB brasileiro) com medidas destinadas a garantir liquidez ao seu sistema econômico, além de benefícios e alívios fiscais para permitir uma retomada de atividades de forma razoavelmente organizada. Portanto, foi possível ao bloco alocar recursos para o enfrentamento de uma crise de grande magnitude sem causar maiores descontroles no ecossistema regional.

A Rússia, origem da nova realidade de defesa europeia, aumentou a participação dos gastos militares para 6% do seu PIB. Ocorre que a economia russa equivale a economia italiana, ou apenas 10% do PIB da União Europeia. Portanto, para equiparar seus investimentos militares aos de Moscou bastaria a Bruxelas comprometer apenas 0,6% do orçamento do bloco.

Cabe lembrar ainda que a UE como um todo tem menor relação dívida/PIB do que Estados Unidos, Japão e mesmo a China. Portanto, um aumento de gastos como o que está sendo delineado talvez não deva ser visto como excepcionalmente preocupante, ainda que as dívidas dos países venham a crescer com tais investimentos em defesa. Na pandemia, por sinal, o mercado soube assimilar a repentina expansão de gastos no continente, vendo nisso uma medida essencial e inadiável. E na Europa de 2025 cresce rapidamente a sensação de que é simplesmente inescapável garantir o aumento de proteção frente a uma possível ameaça externa.

Além disso, o outro lado da moeda da expansão da rubrica militar no continente deve ser um certo nível de impulso econômico. Afinal, a região fabrica aviões militares; sistemas e equipamentos de defesa; carros de combate; mísseis; armas e munições. Ou seja, se por um lado os investimentos militares ampliarão os gastos, não é menos verdade que tais recursos poderão parcialmente irrigar a atividade industrial e neutralizar os custos da defesa na região.

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